e tá tudo tão quente aqui. tão tão tão quente que dá até pra desistir. a gente desiste de pensar porque pensar também cansa no calor. pensar derrete. e eu vou derretendo pelas mãos, pelos pés, pelos cabelos. tudo pinga. pinga a inscrição feita, que agora não dá mais pra mudar. pingam as lágrimas que caíram ontem, junto ao suor, feitas de tanto sentimento junto, misturado num liquidificador mental. toda a insegurança, o medo, todas as dores e pesos na consciência, desceram todos eles juntos, todos pingaram de uma vez. pingou forte o ciúmes, latejante, escaldante. o ciúmes menos feio e mais bonito de todos. pingou tanta saudade. saudade do que vai embora, do que não voltou, do que ainda não veio. pingou cintilante o maior amor do mundo, que eu teimo em sentir que sinto.
pingou, escorreu por tudo quanto pôde e despencou penhasco abaixo. furta-cor feito bolha de sabão, feito confusão, feito mistura. feito a água mais pura que eu já pude beber - e bebo, pra repor tudo uma outra vez e pingar mais.
"doentes do coração, dançavam na enfermaria."
terça-feira, 18 de setembro de 2007
domingo, 9 de setembro de 2007
motivo
Eu ligo o computador pra escrever e só me sai sentimentalismo. Nesse aspecto, eu pareço a Tati Bernardi com essa obsessão pela tecla A. Continuando o plágio então, chega. Vamos dar um tempo pra pobre tecla gasta. Eu continuo não gostando de maiúsculas, e sendo intimista demais e usando a primeira pessoa pra tudo, porque também, não sejamos tão radicais. O caso é que me apareceu bordado em letras de revista um velho novo motivo.
Eu ando mesmo entupida dessas aulas de humanas. Se tem alguma coisa boa, estupidamente boa, nesse terceiro ano, é isso. Esses zilhões de aulas que me entopem de informação e de um conhecimento que quase ninguém mais quer saber. E eu acabo falando pro vento que não sou dessa geração. Disse e redisse: eu queria mesmo era sair por ai com flores no cabelo cantando Beatles e Janis; queria um grupo anti-ditatorial, anti-censura, anti-opressões; queria ter a cara pintada pra tirar o presidente do poder. Mas o fato é que ninguém faz nada. E ninguém faz a revolução sozinho. Eu olho pro lado e só vejo desinteresse. Dos meus amigos, eu contaria no máximo uns dois. O resto é só palavra. E talvez, até mesmo eu. Como diria o orkut, eu faço parte de um grupo de revolucionários preguiçosos. Que passam o dia inteiro olhando comunidades do orkut e pensando como seria bonito se alguém fizesse alguma coisa. Um bando de adolescentes de classe média com nada, ou pouca coisa, na cabeça. E talvez eu até seja um desses hipócritas que tem gritado cansaço. Cansados... Cansados de quê? De ficarmos parados, braços cruzados, assistindo o Bonner anunciar mais miséria, mais corrupção, mais desgraça? É, desgraça, desgraça mesmo, essa palavra feia. Porque tá tudo feio por aqui.
Eu morro de medo de ter filhos. Eu não quero que eles vivam no caos que o mundo vai virar. Não que já não seja, mas tudo tende a piorar. Eu acredito sim no colapso do sistema, no fim do capitalismo. Mas quando um sistema cai, o mundo desmorona. Demora séculos pra se readaptar. E isso sem falar nas causas ambientais. Eles não vão ter água potável, nem ar puro, nem Amazônia, nem estrelas pra contar, e nem paz. A não ser que as coisas sejam revertidas a tempo. Porque eu não acredito que ainda haja tempo. E não é pessimismo da minha parte não, desculpa. É realismo. É como eu li na Carta Capital, aqueles que não se contentam com a mediocridade e a injustiça são sempre considerados pessimistas. Deveriam existir muito mais pessimistas então.
Meus professores têm dito que é tudo falta de ideologia. Eu concordo. Falta ideologia pra maioria, e coragem pros poucos que já tem. Essa é uma das razões da minha escolha maldita. Meu pai estava completamente certo, eu só quero ser igual o Cazuza. Eu sou impregnada dessa mania nojenta de ideais. Eu quero botar meu bloco na rua, e escancarar a verdade feito um tapa na cara de cada um de vocês. Eu quero deixar de preguiça e ler todos os Marx e Neruda e Pessoa que eu puder, pra ter alguma coisa pra falar. Porque eu quero falar tanto, eu quero gritar tanto, eu quero escrever tanto a letra A, que já fico rouca antes da hora.
Eu ando mesmo entupida dessas aulas de humanas. Se tem alguma coisa boa, estupidamente boa, nesse terceiro ano, é isso. Esses zilhões de aulas que me entopem de informação e de um conhecimento que quase ninguém mais quer saber. E eu acabo falando pro vento que não sou dessa geração. Disse e redisse: eu queria mesmo era sair por ai com flores no cabelo cantando Beatles e Janis; queria um grupo anti-ditatorial, anti-censura, anti-opressões; queria ter a cara pintada pra tirar o presidente do poder. Mas o fato é que ninguém faz nada. E ninguém faz a revolução sozinho. Eu olho pro lado e só vejo desinteresse. Dos meus amigos, eu contaria no máximo uns dois. O resto é só palavra. E talvez, até mesmo eu. Como diria o orkut, eu faço parte de um grupo de revolucionários preguiçosos. Que passam o dia inteiro olhando comunidades do orkut e pensando como seria bonito se alguém fizesse alguma coisa. Um bando de adolescentes de classe média com nada, ou pouca coisa, na cabeça. E talvez eu até seja um desses hipócritas que tem gritado cansaço. Cansados... Cansados de quê? De ficarmos parados, braços cruzados, assistindo o Bonner anunciar mais miséria, mais corrupção, mais desgraça? É, desgraça, desgraça mesmo, essa palavra feia. Porque tá tudo feio por aqui.
Eu morro de medo de ter filhos. Eu não quero que eles vivam no caos que o mundo vai virar. Não que já não seja, mas tudo tende a piorar. Eu acredito sim no colapso do sistema, no fim do capitalismo. Mas quando um sistema cai, o mundo desmorona. Demora séculos pra se readaptar. E isso sem falar nas causas ambientais. Eles não vão ter água potável, nem ar puro, nem Amazônia, nem estrelas pra contar, e nem paz. A não ser que as coisas sejam revertidas a tempo. Porque eu não acredito que ainda haja tempo. E não é pessimismo da minha parte não, desculpa. É realismo. É como eu li na Carta Capital, aqueles que não se contentam com a mediocridade e a injustiça são sempre considerados pessimistas. Deveriam existir muito mais pessimistas então.
Meus professores têm dito que é tudo falta de ideologia. Eu concordo. Falta ideologia pra maioria, e coragem pros poucos que já tem. Essa é uma das razões da minha escolha maldita. Meu pai estava completamente certo, eu só quero ser igual o Cazuza. Eu sou impregnada dessa mania nojenta de ideais. Eu quero botar meu bloco na rua, e escancarar a verdade feito um tapa na cara de cada um de vocês. Eu quero deixar de preguiça e ler todos os Marx e Neruda e Pessoa que eu puder, pra ter alguma coisa pra falar. Porque eu quero falar tanto, eu quero gritar tanto, eu quero escrever tanto a letra A, que já fico rouca antes da hora.
segunda-feira, 3 de setembro de 2007
setembro
Ficou ali sentada, parada, estática. Ela, sua saia gigantesca e seus cabelos vermelhos. O único movimento permitido era o da fumaça daquele último cigarro. Tinha um corpo alegre, uma expressão densa, um interior extenso.
Ele chegou com suas sobrancelhas grossas e negras e um olhar de menino perdido. Típico. Espremeu os olhos pra tentar se habituar à pouca luz, fez uma cara de quem detesta estar ali e foi até o balcão. Pediu uma água e esperou.
Sorriu quando a música começou. Era o primeiro sinal vital que emitia dentro dos últimos 40 minutos. Levantou daquela mesa no canto e foi até a beirada do pequeno palco. Prendeu os cabelos num nó e pôs-se a balançar o corpo num movimento leve. Dançava de olhos fechados.
Eles não deviam começar o show com aquela música, ele já tinha dito milhões de vezes. Mas tudo bem, já era. Levantou-se e foi até lá. O vocalista fez cara de surpreso ao vê-lo ali. Ele sorriu. Tirou a câmera da mochila e começou a trabalhar.
Ela tinha alguma coisa quase que espiritual com aquela banda. Toda a sua serenidade se perdia ali. Transcendia a cada nota. Não via ninguém, esquecia de si mesma. Transpirava a cada suspiro do corpo.
Fotografou palco e público, instrumentos e cores de cabelo. E foi bem ai que ele viu aquele vermelho todo. Os cílios ruivos nos olhos fechados. As sandálias baixas de couro. Foi ver de perto pra acreditar: ela cheirava a cigarro e café.
Ela só abriu os olhos quando a música acabou. Sorriu de prazer. Parecia que ia sorrir para sempre. Olhou ao redor. Viu a câmera registrando tudo aquilo e as mãos que a seguravam confiantes. Ergueu os olhos, envermelhou-se de vez. Os olhos negros do fotógrafo a fotografavam, a máquina longe dali. E também sorria, ele todo, olhos mãos boca. Virou os olhos, se recompôs, a outra música já começava.
Queria abordá-la de algum jeito. Um cigarro ou uma água, uma esbarrada talvez. Mas era melhor não. Ela lhe parecia até inatingível vista dali, o belo era não poder tocar. Virou-se, saiu. Mais de longe, fotografou-a, agora de verdade, com a câmera mesmo. Precisava sair dali de uma vez, antes do show acabar. Olhou uma última vez para trás.
Ele estava indo embora e ela não quis acreditar. Era melhor assim, ela sabia. Pra manter aquilo que quase existiu. Ficou olhando, ele viu, ela nem se importou. Sorriram brandamente como que se despedindo, solenes. Como um relâmpago. Viraram-se, ele foi embora e ela ficou, num retorno as suas vidas comuns. Com um quase amor preso no peito.
Ele chegou com suas sobrancelhas grossas e negras e um olhar de menino perdido. Típico. Espremeu os olhos pra tentar se habituar à pouca luz, fez uma cara de quem detesta estar ali e foi até o balcão. Pediu uma água e esperou.
Sorriu quando a música começou. Era o primeiro sinal vital que emitia dentro dos últimos 40 minutos. Levantou daquela mesa no canto e foi até a beirada do pequeno palco. Prendeu os cabelos num nó e pôs-se a balançar o corpo num movimento leve. Dançava de olhos fechados.
Eles não deviam começar o show com aquela música, ele já tinha dito milhões de vezes. Mas tudo bem, já era. Levantou-se e foi até lá. O vocalista fez cara de surpreso ao vê-lo ali. Ele sorriu. Tirou a câmera da mochila e começou a trabalhar.
Ela tinha alguma coisa quase que espiritual com aquela banda. Toda a sua serenidade se perdia ali. Transcendia a cada nota. Não via ninguém, esquecia de si mesma. Transpirava a cada suspiro do corpo.
Fotografou palco e público, instrumentos e cores de cabelo. E foi bem ai que ele viu aquele vermelho todo. Os cílios ruivos nos olhos fechados. As sandálias baixas de couro. Foi ver de perto pra acreditar: ela cheirava a cigarro e café.
Ela só abriu os olhos quando a música acabou. Sorriu de prazer. Parecia que ia sorrir para sempre. Olhou ao redor. Viu a câmera registrando tudo aquilo e as mãos que a seguravam confiantes. Ergueu os olhos, envermelhou-se de vez. Os olhos negros do fotógrafo a fotografavam, a máquina longe dali. E também sorria, ele todo, olhos mãos boca. Virou os olhos, se recompôs, a outra música já começava.
Queria abordá-la de algum jeito. Um cigarro ou uma água, uma esbarrada talvez. Mas era melhor não. Ela lhe parecia até inatingível vista dali, o belo era não poder tocar. Virou-se, saiu. Mais de longe, fotografou-a, agora de verdade, com a câmera mesmo. Precisava sair dali de uma vez, antes do show acabar. Olhou uma última vez para trás.
Ele estava indo embora e ela não quis acreditar. Era melhor assim, ela sabia. Pra manter aquilo que quase existiu. Ficou olhando, ele viu, ela nem se importou. Sorriram brandamente como que se despedindo, solenes. Como um relâmpago. Viraram-se, ele foi embora e ela ficou, num retorno as suas vidas comuns. Com um quase amor preso no peito.
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